30.7.07


Bergmaniano. O cinema de Bergman é o da eterna condição de busca do homem. Seus personagens se movimentam como num palco de sombras shakespearianas, ora em busca de um Deus que nunca se manifesta, ora tentando encontrar um sentido para a vida, enquanto se deparam com ciclos de dor, angústia, medo, doença, traição, loucura, desejo, crueldade, sexo, amor e morte, que a constituem, sem, contudo, oferecerem respostas prontas. Bergman nos deixa como legado um conjunto de obras brilhantes, que desce às profundezas das trevas interiores e opera o milagre de projetá-las magicamente, numa tela suspensa e vazia, entre cores, sombras, luzes, silêncios e sons.

22.7.07


Livros significativos dos anos 70 para cá? A Fogueira das Vaidades, de Tom Wolfe, O Teatro de Sabbath, de Phillip Roth, Meridiano de Sangue, de Cormac Macarthy, A Biblioteca da Piscina, de Alan Hollinghurst e As Horas, de Michael Cunninghan foram alguns que me deram intenso prazer. Os que não me vêm de imediato à memória provavelmente fizeram por merecer seu esquecimento.

18.7.07

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DESCICLOPÉDIA
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A enciclopédia de literatura brasileira do Itaú Cultural, disponível no site da organização, deixa muito a desejar, pecando por suas inúmeras omissões. Uma compilação dos nomes mais relevantes das nossas letras que ignora solenemente Carlos Nejar, Nauro Machado, Carlos Drummond de Andrade, Euclides da Cunha, Osman Lins, Pedro Nava, Rubem Fonseca, João Gilberto Noll, Mário Faustino, Hilda Hilst, Mário de Andrade, entre tantos outros, não pode ainda ser levada a sério.
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Ok, acredito que a coisa, por ser muito recente, ainda esteja crua. Creio que mais dados, como outros nomes, bibliografias completas, etc serão devidamente acrescentados a posteriori. Dos 126 nomes compilados só se lê uma biografia pífia de cada um. Por enquanto, do jeito que ainda está, não dá para entender qual a intenção desse negócio.

O FIM DA HISTÓRIA
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Mal despertas e um brilho inesperado alvoroça
esta manhã, dois girassóis ardentes
crestam-se como archotes num céu
de altíssimas palhoças. É a queda
vertiginosa nas incertezas, a pânica
reafirmação de horrores.
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A História ergue-se, fumegante,
desmente o tolo que a julgar inerte
ou inerme, escreve seu nome a ferro
retorcido e chamas, forja ruínas instantâneas
lança cinzas para o ar e alcança os homens
que não puderam correr das cortinas
de fumaça dos aviões pulverizadores.
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Sandro Fortes, 11/09/2001

3.7.07

O ETERNO RETORNO DE QFWFQ
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A Companhia das Letras, que edita aos poucos as obras completas de Italo Calvino, está lançando Todas as Cosmicômicas, compilação de contos que envolvem Qfwfq, personagem divertidíssimo, que presenciou a origem do Universo e que nos descreve eventos insólitos como o Big Bang, o nascimento e a morte da lua, a extinção dos dinossauros, o surgimento e a evolução das espécies, entre outros baratos. Qfwfq é tão hilariamente onipresente através dos tempos que lembra até a Dercy Gonçalves dando entrevistas irônicas sob a pirâmide do próprio túmulo.
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Trata-se, em parte, de um relançamento de contos já publicados em As Cosmicômicas, só que acrescidos de outros, inéditos no Brasil. Aqui estão finalmente reunidos os impressionantes contos T=0, verdadeiras obras-primas de simetria de Calvino. Em conjunto estes contos podem ser vistos até como uma espécie de paródia típica do Oulipo à Matemática, às Ciências e às Pseudo-Ciências, como o Estruturalismo. Pós-modernidade é isso.
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T=0 me parece o livro mais kafkiano de Calvino. Em O cavaleiro do balde ou Graco, o lenhador, de Kafka, o tempo não se move. E eternamente congelados no interstício entre dois momentos distintos, seus personagens, situam-se num lugar-nenhum, uma espécie de limbo espaço-temporal, onde refletem sua condição fantástica de perpétuos exilados. Eis a linhagem de onde provêm os contos T=0.

1.7.07



O falecido Bruno Tolentino era um poetastro. Sua maior arte, o cultivo de bons amigos na mídia. Que lastimam seu passamento com as loas e discursos laudatórios de praxe, afirmando a grandeza literária do morto e todo aquele blá-blá-blá de que o autor ganhou não sei quantos prêmios em vida. Como crítico era chato. As polêmicas literárias de Tolentino, supostamente furibundas, entediavam até os literatos mais empedernidos. Adorava espancar poetas mortos, como o modernista Oswald de Andrade, cuja poesia, no entanto respira mais viva que toda a obra tolentina. Era um polemista sem o brilho de um Paulo Francis, sem a ironia de um Roberto Campos e sem a verve de um Nélson Rodrigues. Um tradicionalista, no pior sentido da palavra: daqueles que se declaram herdeiros de gigantes, sem lembrar que as tradições literárias consagradas revelam-se pura contradição se não adaptadas às exigências de sua época.