19.11.06


PLACAS

Tantos signos
Trânsito
de estrelas
Fugas noturnas
Ruas solitárias
Palavras
Curvas
Pistas sinuosas

Tantas vozes
Vire
À direita
Pare
Proibido ultrapassar
Atenção
Siga:

Tantas vidas
Crianças
Animais selvagens
Obras
A 200m
Restaurante
A 100m
Hotel
Motel

Tantas vias
Desvio
Área interditada
Declive
Pista irregular
Lombada
Cuidado
Duplo sentido

Tantas palavras
Rotas tontas

Rotatórias.
Órbitas mortas
Obrigatórias
Vidas tortas
Paradas.

11.11.06

TEATRO

O homem comum gostaria de ser o autor de seu destino, mas no máximo é um ator dado a improvisos, muitas vezes um canastrão que participa com falas absolutamente banais, entrando e saindo de cena sem ser percebido; o homem comum é um mero figurante no contexto tragicômico da vida, nessa farsa atroz que é a história, da qual nem ele nem os demais atores conhecem previamente o enredo, as falas, a duração dos atos, o clímax, o desfecho.

Pequena reflexão sobre o amor e o silêncio

George Steiner, grande leitor de Kafka, diz-nos que não há nada mais seguramente destrutivo para um ser humano que o silêncio. Se considerarmos o silêncio em relação ao amor manifesto, por exemplo, nós o entenderemos como a negação desse amor. Aquilo que não tem expressão não existe para nós. Concordo, mas penso que exista um silêncio também que é pura timidez e uma timidez que atue como uma espécie de terror sagrado diante do objeto amoroso. O amor que não ousa dizer o seu nome e que soa tão contrário à palavra poética, permitam-me defendê-lo também. Quantas vezes ele não é mais intenso que o amor jurado em palavras dúbias, sedutoras, muitas vezes insinceras? A falação amorosa, a jura de amor, o desejo e a paixão declaradas são, a meu ver, a explicitação ou a reafirmação de algo que já foi e está sutilmente sugerido a cada gesto, a cada toque, a cada olhar (manifestações silenciosas do amor). Os poetas afirmam que sua poesia é seu sentimento, não nego isso, mas como Fernando Pessoa afirma, o poeta é um fingidor, sei que de fato poemas despertam emoções variadas nos que os lêem (da mais apaixonada à mais fria indiferença), mas um poema é, para seu autor, a despeito do alegado sentimento, acima de tudo, engenho, astúcia, jogo, sedução.
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Um poema é menos expressão do amor que lábia de sedutor, pois o poeta é aquele que arma a teia de palavras com uma intenção disfarçada, ele tece uma rede invisível para capturar a presa, as palavras prendem, eis a contrapartida para o silêncio destrutivo, pois nada ata, enlaça, junta mais fimemente dois seres humanos que a linguagem. João Cabral de Melo Neto considerava os sentimentos vagos, informes demais para servirem como matéria poética, e sua poesia nascia de um silenciar os sentimentos, tornando claramente nítido o mundo que nos é apenas visível. Ele consegue ser ainda mais sensível abrindo mão dos alegados sentimentos de tantos maus poemas por aí. Oscar Wilde lembra-nos que toda má poesia é sincera.
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A situação do amor manifesto me parece ainda mais complicada na era do amor virtual, em que distâncias gigantescas separam os amantes, mas as palavras surgem instantâneas na tela, afirmando uma presença que não está ali. Kafka dizia que trocar cartas era um diálogo enganoso, pois nós "morreremos de sede", enquanto "as palavras serão bebidas no caminho por fantasmas". A instantaneidade da era da internet não me parece reduzir essa sensação de solidão, mas antes agravá-la. Somos impulsionados por uma sensação ilusória de simultaneidade através da internet, por meio dos programas de trocas de mensagens, mas na verdade dialogamos com fantasmas, cientes de que o desejo nasce de palavras e imagens, ainda que pareçam meros simulacros do encontro amoroso: novamente aqui é a rede, a astúcia o jogo que voltam a ser tecidos, empregados e jogados. mas me pergunto onde entram a timidez amorosa, o toque delicado das mãos ou um olhar cúmplice e poderoso, tão necessários ao amor, nesse reino feito de palavras emergentes e urgentes? Com que sutileza poderíamos expressar, via internet, orkut, msn ou e-mail, tudo aquilo que jamais expressaríamos usando as meras palavras?

10.11.06

Let Me Introduce Myself

Este aqui ao lado é o meu primeiro (e por enquanto único) livro publicado, Um passeio mítico pela obra de Clarice Lispector. Nele analiso três romances da autora (Perto do coração selvagem; Uma aprendizagem ou o livro dos prazeres; A maçã no escuro) e também um conto (O Búfalo) de Laços de família. Longe de ver Clarice como uma esfinge sem mistérios, e passando ao largo do senso comum de que sua obra seja "ilegível" ou "confusa", discuto elementos formais (enredos, personagens), estéticos e míticos que compõem a base desses magníficos livros.