28.10.07
25.10.07
LENÇÓIS
Os corpos despidos que aí estirados
erram de mãos vadias ocupadas
entre pernas duras e palavras macias,
letal e lentamente arquejadas,
moldam uma caótica paisagem branca
de espasmo pano e plumas
sobre a cama devastada.
Os braços pesados nadam
imersos em ondas de torpor e brancura
vencido o amor, superados os impulsos,
rendidos à espessura do cansaço,
os lábios murmuram salivas
o algodão sorve a seiva aliviada
dos corpos sonoros cálidos caídos
entre taças de prazer e tecidos.
A claridade alveja os amantes
afogados à orla da aurora
entre cabelos e gestos desfeitos
no plano arbitrário das cobertas
que pouco a pouco recobram vida
crescendo ambos da noite para o dia
despertos, e já desertos um do outro:
corpos despojados entre lençóis nus
após o sexo o sono os sonhos
de plenitude e juventude.
A manhã ocupa descalços
pensamentos que se equilibram
sobre afazeres diáfanos como erguer
camisas do abandono e meias desmaiadas.
Corpos lavam resíduos, vestígios.
Desejos vestem-se, bocas despedem-se.
Mãos alisam, abotoam, atiram
lençóis, cambraias e sedas num baú
profundo e nu, sozinho no escuro.
30.7.07
22.7.07
18.7.07
Ok, acredito que a coisa, por ser muito recente, ainda esteja crua. Creio que mais dados, como outros nomes, bibliografias completas, etc serão devidamente acrescentados a posteriori. Dos 126 nomes compilados só se lê uma biografia pífia de cada um. Por enquanto, do jeito que ainda está, não dá para entender qual a intenção desse negócio.
3.7.07
1.7.07
22.6.07
A pobreza da voz em tempos de escassez
nestes dias de gritos
ou de palavras atiradas a esmo ermas de sentido,
a voz despojada de tudo, até de si mesma, recolhida
ao poço da garganta negra
isolada fechada atenta
sem os papéis as funções os discursos utilitários
em que cada sílaba comercia com outras
em que as cifras salivadas
compram cigarros jornais convicções
enquanto o pensamento enamorado do silêncio
em nada confia a nada se entrega sem
previamente saber-se traído roubado perdido
pois dizer-se é sempre um erro uma subtração
ou um transbordamento
oh recolha-se a voz exausta à sua nudez
à mudez desvelada à sala calada ao dia desfeito.
Para que depois renasça a voz
em seus prazeres mais simples:
o bocejo o alento o segredo a rouquidão
o murmúrio a ironia a melodia
o palavrão o canto
antes dos contágios
antes dos clichês
antes do tirocínio
14.6.07
Me sinto esvair
Pelas mãos
Resvalar
De miséria em miséria
dividido
entre a fome
a nudez
& a cobiça
Sinto-me dispersar
Sem divisas
esvair
pela terra
imiscuído
à promiscuidade
de negócios
câmbios & burlas
Sinto-me perdido
entre
ascos, cifras
e dívidas
já sem valor
torpe
vil
corrosivo
Quero ser
devolvido
aos segredos
dos cofres
Ou dormir
como um óbolo
inútil
sob
a língua
dos mortos.
11.6.07
10.6.07
4.6.07
Unidos por nós
Crescendo como círculos nas águas
Ou ramos tortuosos e seus frutos
Feitos para a fome e para o rubor
Entre braços selvagens e musicais
Pétreas e aéreas pernas
Ante claras divisas latejantes
Sobrevoando a solidão tentando arrefecê-la
Rir dela com pálidos dentes
Atando laços
e abraços.
Eu e tu
Amplamente espalhados
Expansivos irrefreáveis
Como espelhos rubros
Faces solares do amplo incêndio
Vértices da entrega arrebatados no ar
Como pontes e arcos noturnos
unindo astros terríveis
nossas línguas axilas mandíbulas
são evidências mordentes
de gestos e atos iniciais
que transcendem os horizontes de tédio
que separam casas e ruas
entre nós
de sapatos
já de partida a rumos opostos da cidade
retomaremos vidas e hábitos
mas levamos conosco as simétricas
metades de um segredo audaz.
3.6.07
2.6.07
O rosto é um mapa vertical
rija paisagem sem estrelas
Deserto sedento estendido
entre leques e travesseiros.
É um vale incerto e o
Exíguo país dos lábios
Quieto inquieto ambíguo
Ou como um horto um jardim
florescendo risos e angústias
O rosto é uma enseada, um porto
uma ponte entre a dor e o nada
Uma nuvem no alto
7.5.07
contempla-se irmanado
ao espelho
num ritual
de cristal deslumbrante
e sorriso
nada o protege
do fulgor
da estonteante beleza
refletida
é um belíssimo monstro,
jovem, asseado
e imberbe
dentes brancos
óculos escuros
todos os ornatos
e aparatos
de uma juventude
invejável
ele não sabe
que os deuses
impiedosos
por piedade
farão aflorar
do seu corpo líricas
pétalas
Ele não sabe nadar.
26.4.07
Há um eu e um tu de inverno
Patinamos sobre o gelo
Das incertezas do mundo
E tentamos rodopios graciosos
que redundam em tombo.
Mal quedamos
E um sorriso frágil
vem nos reanimar:
Não estamos partidos
Fôssemos delicados
Ficaríamos caídos
Até a primavera
Esperando
12.3.07
1.
Não me apanham vivo
Partirei desta para melhor
Antes que seja tarde
2.
Escrevo estas mal-traçadas
Quantas vezes forem necessárias
Só Deus sabe onde ele se enfiou.
3.
Eu sou o que eu sou.
Não fico aqui nem mais um minuto
Onde Judas perdeu as botas.
4.
Sinto muitas saudades
Mas isso são águas passadas
Agora é bola pra frente.
5.
Façam suas apostas
Fiquei entre a cruz e a espada
Salve-se quem puder
6.
Tenho uma boa e uma má notícia
Já passa da hora de criança dormir
Chega de conversa fiada
7.
Agradeço em nome de todos
Minha vida é um livro aberto
Tanto faz quanto fez
8.
Sou todo ouvidos
As coisas vão de mal a pior
Guarde seus conselhos pra você mesmo
9.
Amanhã é um outro dia
A gente se vê por aí
Deus me livre e guarde
10
Agi movido pelo coração
Palavra de honra
Não sei onde eu estava com a cabeça
11
Dê tempo ao tempo
Ela desapareceu por encanto
E foram felizes para sempre
12.
Não quero ouvir mais nada
Foi bom pra você também?
Vai ver se estou lá na esquina.
13.
Comeu o pão que o diabo amassou
Enfrentou tudo de peito aberto
Ninguém é perfeito
14.
Joga na minha cara
Luz da minha vida
Isso não é da sua conta
15.
Não sei o que eu faria sem você
Pouco me importa
Vai lamber sabão.
16.
Não faz mal
Quem sabe da próxima vez
Tudo bem com você?
17.
Olha nos meus olhos
Não me diga
Tanto trabalho por nada
18.
Somos apenas bons amigos
Essa doeu
Somos uma família unida
19.
Falando com toda sinceridade
Só o tempo dirá
Eu estou sem trocado.
20.
Fomos pegos de surpresa
Fiz todo o possível
Muito obrigado pela preferência.
8.3.07
a aurora.
E cego, escrevo
cartas ao fogo
Caderno áspero
esse meu silêncio.
Varro as instâncias
do olhar precário
e assumo
claridades,
noturnas que sejam
Recomeço
na mais estrita pobreza
Nada em mãos:
só a nudez
dos gestos áridos,
palavras rápidas
isentas
de qualquer amor
numa ríspida canção.
Não tenho pérolas
mas as unhas
os dentes
frementes
um luar caído
dos ombros
Ofereço
o meu silêncio
como casa.
O sono
das asas.
O mar dos cabelos.
Os desertos
das mãos.
Minha vida
é um respirar
entrecortado
por palavras.
Um corpo
quedo
na cama.
Gestos, atos
e mais nada.
Um dia serei
algo mais:
pó inquieto
na orla
despojada
13.2.07
27.1.07
Apesar do exílio
no gesso dos gestos.
Atravesso a sala
ambulante sombra
entre escombros,
atos, ascos.
Os ombros rondam
pela casa inabitável.
O silêncio me açula:
desvio inquieto
dos terraços da morte
para o rio da noite
Nem sei quê
espessa o espelho
como um ódio ancestral
nos olhos alheios
que também são meus.
Guardo um rugido
na cela dos dentes.
um estalo de vidros
vibra em sonho.
Primário rancor
sobrado
nos braços, nos ossos
nos restos
de dor selvagem
que doma o animal
que dorme na carne.
Despido de mitos
delírios ou delitos
Sou meu grito:
Hino inaugural
23.1.07
O Quarteto de Alexandria - Lawrence Durrell
Finalmente, pela Ediouro, uma edição nacional do fabuloso Quarteto de Alexandria, a obra-prima de Lawrence Durrell. Cada volume tem um nome de personagem: Justine, Balthazar, Mountolive e Clea. A narrativa é modernista: fragmentada, descontínua, desagregada de qualquer cronologia, avança e recua livre no tempo, fundindo passado, presente e futuro. Pode-se dizer que a grande protagonista dos livros é a cidade que dá nome ao Quarteto, uma Alexandria cheia de personagens que vivem obcecados por sexo, todo tipo de sexo, embora nem seja isso o que mais se destaca no texto, e sim o clima de ironia, de sordidez, de desespero e uma gama de tudo isso junto. É um livro poderoso, por vezes terrível, de uma beleza cruel. (Não à toa: o título de "Justine" foi tirado do Marquês de Sade). Um breve trecho:
"Um camelo desabou de exaustão na rua. É pesado demais para ser levado ao matadouro. Dois homens aproximam-se empunhando um machado e ali mesmo, em plena rua, despedaçam o animal ainda vivo. Destrincham a carne branca - a pobre criatura parece cada vez mais sofrida, mais aristocrática e mais confusa quando decepam-lhe as pernas. Ao fim resta apenas a cabeça, ainda viva, com os olhos abertos, inquietos. Nenhum grito de protesto, sequer um esboço de resistência. Como uma tamareira, o animal se submete aos algozes. Nos dias seguintes, porém, a rua de terra fica encharcada com seu sangue e nossos pés descalços são marcados por essa mistura."